Um estudo feito no Recife e que será divulgado na sexta-feira (15) no encontro anual da Academia Americana de Neurologia, em Vancouver no Canadá, encontrou evidências de associação entre o vírus e a ADEM em pelo menos dois casos.
Cientistas já desconfiavam de uma conexão entre o zika e a ADEM, conforme mostrou o jornal O Estado de S. Paulo em fevereiro. Mas só agora serão apresentados os resultados científicos do estudo liderado por Maria Lucia Brito Ferreira, chefe do Serviço de Neurologia do Hospital da Restauração, no Recife.
“Embora seja um estudo pequeno, ele pode fornecer evidências de que o vírus causa no cérebro efeitos diferentes daqueles que haviam sido identificados nos estudos em curso. Mas muita pesquisa ainda terá de ser feita para explorar se há uma relação causal entre o zika e esses problemas cerebrais”, disse Maria Lúcia.
No estudo os cientistas acompanharam, entre dezembro de 2014 e junho de 2015, todos os casos que chegaram ao Hospital da Restauração com sintomas de infecção por arbovírus — a família de vírus que inclui zika, dengue e chikungunya.
Todos os pacientes estudados chegaram ao hospital com febre e erupções na pele. Alguns também apresentavam coceiras, dores em músculos e articulações, além de olhos vermelhos. Alguns tiveram sintomas neurológicos logo em seguida e outros os apresentaram cerca de 15 dias depois.
Os autores registraram 151 casos com algum tipo de manifestação neurológica, mas seis deles desenvolveram sintomas neurológicos típicos de doenças autoimunes — aquelas nas quais o sistema imunológico do paciente ataca e destrói células de tecidos saudáveis de seu próprio organismo.
Nos pacientes com ADEM, segundo os especialistas, as células de defesa do organismo no cérebro e na medula espinhal atacam a bainha de mielina, uma cobertura de gordura que envolve as fibras nervosas e tem função semelhante à da capa de um fio condutor de eletricidade. A síndrome de Guillain-Barré também é autoimune e envolve danos à bainha de mielina.
Quando tiveram alta do hospital, cinco dos seis pacientes continuavam com problemas motores. Um teve problemas de visão e outro apresentou problemas de memória e de capacidade de raciocínio.
“Isso não quer dizer que todas as pessoas infectadas com o zika terão esse tipo de problema cerebral. Daqueles que apresentaram problemas no sistema nervoso, a maior parte não tem sintomas cerebrais. No entanto, nosso estudo pode ajudar a esclarecer possíveis efeitos duradouros com os quais o vírus pode estar associado no cérebro”, disse Maria Lúcia.
“Neste momento, não parece que os casos de ADEM estejam ocorrendo com uma incidência tão grande como a dos casos de Guillain-Barré, mas essas descobertas feitas no Brasil sugerem que os médicos devem ficar vigilantes quanto à possível ocorrência de ADEM e de outras doenças autoimunes relacionadas ao sistema nervoso central”, disse James Sejvar, do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) de Atlanta, nos EUA.
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